O novo presidente do Senado usou empresas da família e do contador e presidente do comitê financeiro do partido para justificar gastos de R$ 763 mil que estão sob suspeita
© Pedro França/Agência Senado
Alvo de três ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo supostas fraudes na campanha de 2014, o novo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), usou empresas da família e do contador e presidente do comitê financeiro do partido para justificar gastos de R$ 763 mil que estão sob suspeita.
Gomes é peça central tanto nas ações no TSE, que pedem a cassação de mandato de Davi por abuso de poder econômico, quanto nos inquéritos no STF, que investigam suposto crime de falsidade ideológica. Ele é acusado de ter usado cinco notas frias no valor de R$ 157 mil em nome da empresa L.L.S. Morais-ME na prestação de contas da campanha de Davi e de ter falsificado documento da Prefeitura de Macapá para tentar regularizar a contabilidade.
Uma quebra de sigilo parcial feita ainda durante investigação no âmbito do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá (TRE-AP) constatou que R$ 34 mil referentes a serviços prestados pela L.L.S. foram transferidos para a conta bancária de Gomes. A apuração teve origem em três ações eleitorais movidas pelo ex-senador Gilvam Borges (MDB-AP) – aliado de José Sarney, derrotado por Davi -, pela coligação e partido dele.
O TRE-AP indeferiu o pedido de cassação de mandato em 2016 entendendo que a participação ou ciência de Davi sobre a fraude não foi comprovada e determinou que o crime de falsidade ideológica fosse apurado em uma ação penal, aberta naquele ano. Três recursos foram apresentados ao TSE e estão desde agosto do ano passado no gabinete do ministro Edson Fachin.
Em abril do ano passado, o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, defendeu em três pareceres a cassação do mandato de Davi e dos dois suplentes – um deles, Josiel Alcolumbre, é irmão do senador. O procurador afirmou que “restou comprovada a contaminação da campanha eleitoral” de Davi pelas “ações ilícitas em tratativa”. E, segundo ele, é “impossível desvincular” dos candidatos a figura de Gomes, contador responsável pela prestação de contas, fornecedor de campanha e presidente do comitê financeiro do DEM.
Gasolina
Além das ações envolvendo o contador, também são alvo de questionamento no TSE pagamentos de R$ 285 mil com “combustíveis e lubrificantes” feitos pela campanha de Davi e pelo comitê do DEM para a Salomão Alcolumbre & Cia Ltda., que pertence a uma tia e primos do senador.
Só a campanha de Davi em 2014 declarou ter gasto R$ 135 mil com gasolina em postos da família para 20 veículos. O valor é maior do que os gastos com combustível de todos os outros nove candidatos ao Senado juntos. Com a quantia seria possível encher o tanque de 1.000 carros, fazer 140 viagens de ida e volta entre Macapá e Brasília ou completar quase 17 voltas na Terra.
Dona de uma rede de postos em Macapá, a empresa Salomão Alcolumbre aparece como fornecedora de campanha em 2014 de outros 40 candidatos e três comitês ou diretórios partidários. Os gastos de Davi e de outros dois parentes candidatos naquele pleito, porém, representam mais da metade dos R$ 551,5 mil que a empresa da família recebeu naquela eleição.
O jornal O Estado de S. Paulo tentou por quatro dias falar com Marina Alcolumbre, uma das proprietárias da rede de postos. Davi emprega em seu escritório político em Macapá a mulher de um dos primos herdeiros da empresa. Na sexta-feira, a reportagem não localizou Vânia Alcolumbre por telefone em seu local de trabalho.
A assessoria do presidente do Senado não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem até a conclusão desta edição. Davi tem afirmado que a prestação de contas foi aprovada pelo TRE do Amapá e que “está convicto de que, ao final das apurações, restarão todas as alegações esclarecidas e devidamente dirimidas”. Na disputa pela presidência da Casa, ele usou o discurso da renovação na política, se contrapondo ao senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Rynaldo Gomes não foi localizado. A R.A.M. Gomes e a L.L.S. Morais estão inativas, segundo a Receita Federal.
Parentes
As supostas irregularidades na campanha de 2014 do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também envolvem duas emissoras de TV da família do senador no Amapá, que teriam produzido, segundo ação que tramita no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), material de campanha clandestino e nota fiscal para prestação de contas com data posterior ao término da eleição.
A ação movida pelo diretório estadual do MDB contra Alcolumbre acusa a campanha do senador de apresentar uma nota de R$ 2,5 mil emitida pela empresa TV Amazônia Ltda.-ME, afiliada da TV Band no Amapá e dirigida pelo irmão e suplente de Davi no Senado, Josiel Alcolumbre, para compra de diversos materiais gráficos.
Além da nota fiscal ter data posterior à da eleição, o que é vedado pela lei eleitoral, o cheque de R$ 2,5 mil que deveria ter sido pago à empresa de Josiel foi descontado em espécie pelo contador da campanha, Rynaldo Gomes, que já é investigado pela suspeita de usar notas frias e receber recursos de outros fornecedores.
Em parecer pela cassação de Davi, em 2018, o vice-procurador-geral eleitoral Humberto Jacques Medeiros, afirma que o fato “confirma” que foram usados na prestação de contas do senador “expedientes com vistas a ocultar o real destino dos valores movimentados na campanha e impedir ou, no mínimo, dificultar o controle a ser realizado pela Justiça Eleitoral, corroborando a conclusão pela necessária cassação dos mandatos pela prática de fraude e abuso de poder econômico”.
A ação movida contra o presidente do Senado afirma ainda que outra empresa da família, a TV Amazônia Ltda. – EPP, que é afiliada do SBT no Amapá e pertence a José Alcolumbre, tio do senador, encomendou em uma gráfica ao menos R$ 5,9 mil em material clandestino. A reportagem não conseguiu encontrar os dois empresários na última sexta-feira pelo telefone das empresas. O senador não retornou o contato feito pelo Estado até a publicação desta matéria.
A campanha de Davi ao Senado em 2014 custou R$ 2 milhões e teve entre seus financiadores as empresas JBS, com doação de R$ 138 mil, e Odebrecht, com R$ 100 mil. Ele não foi delatado pelos executivos da empreiteira e não é investigado pela Lava Jato, mas seu nome aparece na lista fornecida ao Ministério Público Federal por Joesley Batista, da JBS, dos supostos beneficiários de propinas “disfarçadas” de doações. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.